sábado, janeiro 16, 2010

Com quantos cadeados eu me protejo?

Há alguns meses, quando vim morar em Brasília, tive a terrível sensação de ter minha bolsa roubada de dentro do carro de uma amiga. Fomos a um show, deixamos o carro no estacionamento iluminado e seguimos. Na volta, vidro quebrado e minha bolsa roubada. Prejuízo? Sim. Do vidro dela, meus documentos, cartões, maquiagem e o sono das duas. Mas tudo bem, estávamos em segurança, nenhuma agressão física. Menos mal, nos consolaram. Será?

Ontem, ao chegar do trabalho, encontro a porta do meu apartamento aberta, sem arrombamentos. Notebook com todos os arquivos de uma vida roubado, modem de internet 3G além das jóias de prata todas levadas. Roubo aparentemente rápido, sem mexer em muitas coisas. A chave havia sido trocada, mesmo assim, entraram aqui. Delegacia, faz B.O. e responde a várias perguntas. Faça uma lista de tudo que roubaram, diz o moço educado. Posso pôr aí nesse documento que roubaram o meu sossego?

É preciso trocar a fechadura, mais uma vez. Como iria dormir? Ligo pro chaveiro, a perícia chega, não podemos concluir nada aqui, você mexeu na fechadura. Sim, eu precisava pelo menos me sentir mais segura. Eu entendo, mas infelizmente não podemos seguir com a investigação. Ok, obrigada, boa noite. Frustração. Histórias de outros vizinhos que também foram roubados. Todo mundo tem uma teoria. Um prédio com aluguel e condomínios altos, parte nobre da cidade por assim dizer, com dois porteiros e ninguém viu nada, ninguém sabe de nada.

Fechadura nova, agora uma tetra também. Coloca uma correntinha, disse um. Coloca cadeado também, completa outro. Pode pôr grade? quer saber minha mãe aflita ao telefone. Com quantas fechaduras me protegerei? Fico ou saio de casa? Posso viajar e deixar tudo aqui? Para onde for, terei que levar comigo computador, televisão, geladeira, microondas, cama, celular, ventilador, jóias, relógio, sapatos, bolsas, malas, roupas, livros? Devo todo dia observar se falta algo na minha mesa, nas minhas bolsas, se um brinco sumiu?

Não quero viver cercada por grades, com chaves de cadeados que podem ser arrombados. Por quanto tempo vou viver a apreensão de não saber o que encontrar dentro de minha casa? Numa época em que nem se conhece os vizinhos, em quem confiar? Cada um por si, Deus por ninguém? Adianta rezar, espernear, especular? Compra uma arma, brincou o filho de um amigo. Não, não compro. Não, não quero perder a vontade de sair e de voltar pra casa, nem de dar bom dia aos vizinhos, nem desconfiar de qualquer um. Não vou colocar lacre em mim.

O roubo, lamento muitíssimo. Lamento também a falta de caráter em invadir uma casa, levar um bem de outrem, devassar a minha vida documentada dentro daquele HD. Pegar meus anéis de prata favoritos, minha aliança, os brincos e colares que ganhei, que comprei com dinheiro de trabalho. Mas não vão levar meu bom humor, nem o carinho que recebi dos amigos que me acompanharam à delegacia, trouxeram jantar, ligaram, vieram aqui em casa e até me cederam computador e internet seus para ficar comigo o quanto eu precise. Não permitirei que me mudem nem que me assustem mais. O medo dá origem ao mal. Aqui, ele não terá vez.