quarta-feira, julho 18, 2007

Do circo das notícias

Ontem à noite tomei um susto ao dar uma olhada nas últimas notícias antes de dormir. Mais um acidente envolvendo um avião, dessa vez da TAM. Vários mortos, feridos e familiares atônitos. Primeiro pensamento é vasculhar na cabeça se tem alguém conhecido viajando para aquelas bandas. Um certo alívio, não lembrei de ninguém. Dormi pensando nos que estavam e sonhei com LOST. Você se sente pequeno diante de uma coisa como essas. Então, hoje você abre os jornais e só se fala da tragédia. É normal, foi mesmo uma tragédia e de proporções bem razoáveis. Aí, no Bom Dia Brasil, uma repórter solta a pérola: "Apesar de tudo, os funcionários da TAM estão trabalhando normalmente". É o que? Quem consegue trabalhar "normalmente" em uma situação como essas? Em outro flash: "Nosso correspondente em São Paulo foi ao hospital fulano de tal para acompanhar as vítimas que sobreviveram ao acidente. Cicrano, você conseguiu falar com algum familiar? Como eles estão se sentindo?" OK, cara pálida. Imagina que tua família estava no avião, voltando de férias e de repente, bum, explode tudo e agora você não tem mais família. Realmente, há como explicar o que se sente nesse momento? É muita falta de respeito, minha gente. O que mais me incomoda em situações como essa, é de fato a cobertura jornalística. As notícias existem para nos mostrar o que acontece, para que acompanhemos os fatos e possamos usar a informação de forma bacana e não o circo que teimam em armar. Pra quê que eu quero saber a história pessoal de cada passageiro? Porque vende jornal, revista e faz as pessoas chorarem, sobe no Ibope. Cada pessoa que morre é uma comoção sim na família, a dor é enorme para amigos e é de uma importância tremenda para quem o cerca. Mais uma vez, OK. Isso não precisa ser propagado aos sete ventos. As pessoas estão vulneráveis, expostas e ficam lá, sendo vendidas como personagens de romances Júlia ou Sabrina. Existe mercado para isso? Óbvio que sim, há quem goste de comer fezes também, nem por isso acho bonito. Fico profundamente incomodada. Decidi que vou fazer minha parte, ter uma leitura crítica mas não vou me envolver com tanta dor, assim, íntima. É um crime, violação da privacidade, não vou fazer isso. As providências precisam ser tomadas e as histórias de cada um respeitadas mas não é dessa forma. Pelo menos eu não acredito nisso.
Comentários:
Isso não é de hoje nas coberturas jornalísticas brasileiras. Desde sempre um termo me incomoda bastante: "pelo menos". Morreram pelo menos, ficaram feridos pelo menos, como se não tivesse sido suficiente. Quanto mais sangue, quanto mais trágico, quanto mais mutilado, melhor. O G1 tá com uma série de imagens do acidente, alguém conseguiu tirar fotos dos corpos carbonizados. Pelo amor de Deus, não fotografou de perto porque não conseguiram, mas jura que precisa tirar foto do cadáver, de uma pessoa que poderia ser amigo, parente de qualquer um de nós? É um desejo mórbido demais para eu entender...
 
Ah, só pra completar: Jornal Hoje começou nesse segundo com a leitura da lista de passageiros e mostrando o desespero das pessoas ao confirmarem seus entes queridos entre os mortos.
 
eu estava pensando justamente sobre isso hoje a tarde, enquanto assistia o noticiário. "cadê o respeito pelas pessoas?". não só pelos parentes das vítimas, mas pelas pessoas que estavam no aeroporto no momento e estavam desesperadas porque não queriam mais viajar de avião. sob o pretexto de mostrar ao mundo os "fatos", acabam ultrapassando a linha do bom senso.

:)
 
É um circo mesmo, Van, cheio de palhaços segurando o microfone. E quanto mais gente chorando, pessoas correndo com mão na cabeça de desespero, melhor pro ibope. Eles mostram e tem quem goste de ver também. É também via de mão dupla a falta de respeito.

E eu que desliguei a TV para não ficar mais nervosa ainda com o Aloísio rumo ao pan-pan-pan?!
 
Ainda hoje, 6 dias depois, as pessoas insitem em...como dizer...pisotear, esmagar, acabar com o poquinho que resta de cada parente ou vitima dessa desgraça. Quero saber dos fatos, nao da dor de cada um. Mudo o canal, e la está tudo de novo. Não quero fazer parte desse mundo.
 
Conheci seu blog através de um amigo e, confesso, estou gostando muito dos seus textos. Concordo com o que vc falou sobre a mídia de tragédia, que como urubus em cima da carniça vasculham, remexem, maltratam e menosprezam a dor alheia.
A intimidade do sofrimento foi banalizada e é abordada da mesma forma que um jornal quando anunciou que "mesmo com o acidente, o trânsito em São Paulo está normal". Cara, diante de tudo isso ainda existem pessoas preocupadas em relatar se o engarramento aumentou?!? É preciso ter sensibilidade, não para sofrer a mesma dor que o outro vive, mas ao menos para entender que existem momentos em que o respeito deve se impor à curiosidade. Abraços.
 
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