quinta-feira, novembro 26, 2009

Lá é o meu lugar


Não tem jeito. Eu passo o ano esperando fevereiro chegar para subir e descer as ladeiras de Olinda atrás dos meus blocos favoritos. Sofro no calor, com a multidão mas encaro horas de shows no Recife Antigo e choro de saudade na quarta-feira ingrata de Cinzas. Fico eufórica pensando no colorido dos maracatus, ensaio meus passos de frevo, cantarolo cirandas e afoxés. Não há festa que me defina melhor, não há mês que me faça mais feliz, não há destino de viagem que me seduza a trocá-lo.

Já escolhi as fantasias, fiz na cabeça o trajeto mental de por onde passarei, já escuto os clarins de Momo bem aqui do meu lado. Na farra, levo os amigos para a mesma casa, planejamos as roupas parecidas e combinamos de ganhar mais resistência no corpo e na saúde. Começa o estoque de vitamina C, o reforço nas caminhadas, a promessa de dieta. Depois de cinco anos estarei solteira naquelas ruas e não há como não esperar os amores de carnaval, os pierrots da minha volta como Colombina. Tudo faz parte da magia. Não sei aonde passarei Natal e nem em que cidade entrarei 2010, mas sei que em fevereiro estarei em Pernambuco porque lá é o meu lugar.

segunda-feira, novembro 16, 2009

Dos quereres

Sou dessas pessoas decididas. Se quero, quero. Demoro poucos minutos para bater o olho numa mercadoria e levar para mim. Não me retenho em lojas, não provo milhares de coisas antes de decidir do que gosto. Sou prática, rápida e objetiva. Mas no campo da sedução, ah, aí a coisa é diferente. Apesar da clareza de intenções, o ritual do avançar e voltar um passo me interessa. Nessa minha nova vida de solteira, tem sido engraçado voltar a isso. Os cuidados, as palavras escolhidas, as descobertas dos gostos, dos cheiros, das aventuras, preferências. Tudo me interessa.

Sempre fui de rompantes. De me apaixonar e pegar um avião, um trem, uma balsa, qualquer coisa para ver a pessoa lá na Conchinchina. Sem medo, sem expectativas, só para viver momentos em tons de vermelho. O coração acelera, o corpo aquece, o sangue corre ligeiro. Quero sempre descobrir o que há por trás das palavras. Dificilmente paquero na noite, é preciso conversar, pelo menos alguns minutos. Um mínimo de estímulo intelectual. Os grandes amores e amantes começaram assim comigo. E do mesmo jeito que chegam, vão embora. Sofro, me rasgo, me desespero. Subo, desço, dou mil rodadas, me descontrolo, adoeço, encho a cara. E esqueço. Passo para a próxima casa do jogo.

domingo, novembro 08, 2009

Das estantes

Aprendi a ler cedo, antes de todas as crianças de minha escola. Acho que movida pela curiosidade. Lembro como se hoje fosse, sentada no colo de meu pai na cozinha da casa do campo, lia com ele as manchetes do Diario de Pernambuco. Ele achava graça, pedia para eu ler as legendas. Eu me exibia, lia os subtítulos também.

Minha casa sempre teve muitos livros. Havia uma coleção ilustrada com as lendas do folclore brasileiro. Boitatá, Saci Pererê, Curupira foram aos poucos tornando-se meus companheiros de aventura. As lembranças de meus seis anos não são de assistir ao Balão Mágico na TV, mas a de vasculhar as estantes da sala e me deparar com a obra de Monteiro Lobato e um dicionário. Aquele livro repleto de palavras me encantou de uma maneira que todos os dias ao chegar da escola escolhia 10 palavras para decorar os significados. Depois, corria até as empregadas e contava o que tinha aprendido. Ensinei ao nosso papagaio as mais difíceis e engraçadas para a minha pouca idade: catástrofe, nauseabundo, pachorra (que ele repetia como cachorra)...

Morávamos no interior de Pernambuco e não havia livrarias na cidade. Os livros eram adquiridos através dos vendedores porta a porta e sempre que um chegava em nossa casa, eu e minha irmã tínhamos ataques de euforia. Para desespero de minha mãe e salvação do mês do cacheiro, queríamos as coleções todas. Contentes, passávamos horas folheando as novas aquisições, sentindo o cheiro do papel novo, a textura das páginas. Eram momentos de entrega profunda e quando a viagem da leitura começava, a vida lá fora congelava.

Quando fiz dez anos, visitando meus avós no Recife, mainha disse que eu poderia escolher meu presente de férias. É que não tínhamos hábito de nos presentear em datas normais como aniversários, dia das crianças e Natal. Dar um presente era a qualquer hora, sem motivos especiais. Eu disse a ela que queria conhecer uma livraria e escolher um livro. Foi aí que dei de cara com a Livro 7, bem no centro da cidade.

Meus olhos nunca tinham visto coisa como aquela. Estantes repletas, capas coloridas, volumes ilustrados, revistas, jornais, gente sentada em banquinhos lendo. Não sei por quanto tempo demoramos ali. Escolhia um novo livro, depois colocava de volta, escolhia outro. Andava lentamente, com medo que se corresse poderia perder algum volume que me passasse rápido pelos olhos. O dono perguntou a minha mãe se era a minha primeira vez ali e ela respondeu sorridente que sim. Acho que notando a minha angústia, foi até mim e disse que poderia voltar quando quisesse. Agarrada com uns seis exemplares de autores diferentes expliquei que morava em outra cidade e queria levar livros para o semestre todo.

Escolhi Guerra Dentro da Gente de Paulo Leminski. "Um apenas", pediu minha mãe. Depois desse vieram muitos outros. Ir a Recife significava mais que ver a família, era visitar a Livro 7. Alguns anos mais tarde, quando nos mudamos em definitivo para a capital, minhas tardes de sexta-feira eram dedicadas aquele lugar mágico. Lá descobri Fernando Pessoa, Mário Quintana, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, Marx, Nelson Rodrigues, Ascenso Ferreira. O dinheiro da mesada tinha destino certo.

Hoje, ao chegar em uma nova cidade, os primeiros lugares pelos quais pergunto são botecos, livrarias e sebos. Quando fui morar em Fortaleza, minha mãe só acreditou que era para valer ao pedir que me enviasse os meus livros. Agora, em Brasília, não posso descrever a felicidade com a qual recebo a notícia de que uma caixa com conteúdo inestimável segue do Ceará para cá pelas mãos de um amigo. Mal posso esperar para abri-la e reconhecer os cheiros, as texturas e as histórias contadas. Minha casa começa a ficar completa.

sexta-feira, novembro 06, 2009

Dos dias

Caminhada. Terapia. Ioga. Cerveja. Choro. Música. Reza. Amigos online. Novas companhias. Banho de chuva. Suor. Spicy. Beirut. Líbanus. Dançar. Gargalhar. Família. Raiva. Ex. Saudade. Possibilidades. Equilíbrio.